III Câmara de Mediação e Arbitragem do Brasil

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A ARBITRAGEM

A arbitragem começa a ser levada a sério no Brasil, acompanhando os países mais adiantados do planeta. Da insurgência do mundo jurídico à sua gradativa e efetiva absorção, houve significativo avanço, conquanto falte muito para sua plena adoção. Este sistema alternativo, simples, informal e ágil de solução de conflitos entre as partes ganha espaço considerável, a cada momento. Trata-se de instrumento utilizado pelo homem, desde que este apareceu na Terra, como demonstram documentos históricos e religiosos. O Brasil conhece a arbitragem, desde as Ordenações Filipinas, e tem o privilégio de inovar também no campo do Direito Público, permitindo ou até impondo que as disputas se resolvam de forma amigável, por meio da conciliação ou pela arbitragem. [1]

A Suprema Corte Brasileira julgou constitucional a Lei 9.307, de 1996, visto que a manifestação de vontade da parte na cláusula de compromisso e a faculdade concedida ao juiz, para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar compromisso, não colide com inciso XXXV do artigo 5º que proíbe a exclusão de apreciação pelo Judiciário de lesão ou ameaça a direito (Plenário, maioria de votos. Sentença Estrangeira, 5206-7. Decisão publicada – Ata 40, DJ de 19.2.2001).

As partes podem perfeitamente renunciar à via judicial, elegendo o juízo arbitral para dirimir os conflitos que por ventura surjam, nas suas relações contratuais. É um instrumento altamente salutar, pois afasta de pronto o formalismo e tudo ocorre fora do foro judicial ou das vistas do Poder Judiciário, com o que tudo se fará de maneira célere, sigilosa, informal, sem ferir obviamente os cânones legais e a Constituição. A flexibilidade é uma constante.

 No Direito Público, a Lei 8.987/95, que regula o regime de concessão e permissão de serviços públicos previstos no artigo 175 da CF, estabelece como cláusula essencial a que diz respeito ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais (artigo 23, XV), aplicando-se a esses contratos administrativos também a Lei 8666/93(artigo 2º).  Neste sentido, consultem-se, entre outras, as Leis 9.472/97, 9.478, /97, 10.233/01, 10.343/02.

Os contratos internacionais, regidos pela Lei 1518/51 e pelo Decreto-lei 1312/74, contém cláusula arbitral para a solução de conflitos.

Na área tributária, a arbitragem é tida como instrumento necessário para a resolução de conflitos entre o Poder Público e os devedores.[2] A assembléia das XXII Jornadas Latinoamericanas de Derecho Tributario resolveu recomendar aos países membros do ILADT – Instituto Latinoamericano de Derecho Tributario que instituam, mediante lei, meios alternativos de solução de controvérsias em matéria tributária, notadamente a arbitragem, tanto na ordem interna quanto na internacional, visto que a indisponibilidade não obsta a adoção de meios alternativos de solução desses conflitos, especialmente a arbitragem, no âmbito interno. A justificativa calcou-se no fato de que os mecanismos tradicionais de solução de conflitos, na área tributária, não satisfazem às necessidades nem do Estado nem do contribuinte[3].

          A Ministra Nancy Andrighi[4], nos autos da Medida Cautelar nº. 9796-GO (2005/0048663-4), defende a tese, sem dúvida inovadora, na Instância Superior, de que o processo vale pelos resultados produzidos na vida das pessoas, não devendo o magistrado ater-se apenas aos requisitos processuais. Cabe-lhe precipuamente a função de pacificador social, visando afastar os conflitos com justiça. Calcada no artigo 125, inciso IV do CPC, antes de apreciar a pretensão de atribuir efeito suspensivo ao recurso especial, houve por bem de propiciar às partes litigantes a oportunidade de terminar o conflito por meio da conciliação, designando para esse fim a audiência. Sua Excelência, num rasgo de profunda sensibilidade, aduz ainda que o comando legal se dirige não apenas ao juiz de primeira instância, mas também aos tribunais superiores. Determinou a intimação das partes da forma mais célere e eficaz, autorizando a utilização dos meios modernos de comunicação.

          Um ponto de suma importância, que não pode ser olvidado, diz respeito à parte da proposta de emenda constitucional nº. 45, que retornou à Câmara dos Deputados. A proposta inseriu um parágrafo ao artigo 98, conferindo permissão aos interessados resolverem seus conflitos por meio da arbitragem. Trata-se de conquista, sem precedentes, igualando-se a Portugal. Não obstante, ao afastar as entidades de Direito Público, vedando-lhes esse direito, operou um retrocesso merecedor do mais veemente repúdio. Eis o texto, tal qual aprovado na Câmara: “Ressalvadas as entidades de direito público, os interessados em resolver seus conflitos de interesse poderão valer-se do juízo arbitral na forma da lei”.

A parte da proposta da reforma do Judiciário aprovada pelo Senado Federal[5] retornou à Câmara dos Deputados, para discussão, com o destaque aprovado naquela Casa do Congresso e mantido, no sentido de acrescentar um parágrafo ao artigo 98 da Constituição, para permitir aos interessados em resolver seus conflitos de interesse valer-se do juízo arbitral na forma da lei, sem qualquer restrição, em relação às entidades de Direito Público. Desta forma, estará constitucionalizando o que já vem sendo realizado nesta área, segundo a legislação vigente. A arta Constitucional portuguesa, ao tratar da organização dos tribunais, faculta a existência de cortes arbitrais[6].     

A lei brasileira, no que diz respeito à execução da sentença arbitral condenatória, sem embargo de esta constituir título executivo judicial, autoriza a parte interessada pleitear ao Poder Judiciário a decretação da nulidade da sentença, nos casos previstos na lei, ou ainda mediante ação de embargos do devedor, segundo o disposto no artigo 741 do CPC, modificado pela Lei nº. 11.232, de 22 de dezembro de 2005. Também a instituição da arbitragem, em caso de resistência de uma das partes, se houver cláusula compromissória, caberá ao juiz togado fazê-lo. 

Desta forma, o que se resolveria em, no máximo cento e oitenta dias, poderá levar anos, devido à morosidade da Justiça, cuja culpa não cabe absolutamente aos magistrados, dedicados e cultos, mas sim à estrutura do Judiciário e à processualística retrógrada e burocratizante. Nem a parte da reforma do Judiciário já em vigor nem as alterações fatiadas do Código de Processo Civil, que ocorrem a cada instante, conseguem resolver a contento a dramática situação que a todos afligem, notadamente aos magistrados, aos advogados e, primacialmente, ao jurisdicionado.

Eis que sugerimos que a execução da sentença arbitral se faça, com a necessária adaptação, nos moldes da execução extrajudicial prevista no Decreto-lei nº. 70, de 1966, com o aval das Cortes Superiores, inclusive do Pretório Excelso, que a julgou constitucional, ou se proceda a execução na própria corte de arbitragem. [7] A Comissão de Mediação e Arbitragem da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Distrito Federal, por nós presidida, está procedendo a estudos neste sentido, inclusive na elaboração do Código de Ética nacional, e uma subcomissão estuda os problemas que têm havido com instituições de arbitragem, daí por que se faz necessário a edição de lei neste sentido.

É o início da grande revolução neste campo que deverá ser acompanhada, sem dúvida, da aculturação do povo, beneficiando-se de uma justiça rápida, simples, oral, informal e confiável, sob a proteção do Estado.

Assim, é preciso avançar mais, nesse projeto de magna importância, aperfeiçoando-se a lei de regência da arbitragem, no sentido de permitir que todos os atos, inclusive a ação de nulidade e os embargos do devedor, se processem e se decidam nas cortes arbitrais.

Desta forma, o Brasil estará contribuindo, decisivamente, para o aprimoramento da prestação de justiça e rapidez na sua consecução, aliviando a sobrecarga do Judiciário


[1] Cf. Uma Nova Visão da Arbitragem, de nossa autoria, 1ª PARTE, publicada na Revista Tributária e de Finanças Públicas, RT, nº. 58, setembro-outubro de 2004;, 2ª PARTE, publicada na Revista Tributária e de Finanças Públicas nº.  59, novembro/dezembro 2004;  publicação integral no  nº. 39, setembro de 2004,  na Revista Portuguesa de Direito do Consumidor, Coimbra, Portugal, bem como em sites da Internet. Cf. também artigo do Ministro José Delgado, A arbitragem, no Brasil – Evolução Histórica e Conceitual, na internet, no site www.arbitragem.com.br/artigo%20Arbitraggem%20%Jos%E9%20Augusto%20.Delgado.htm

 

[2] Cf. o artigo “A Arbitragem na área tributária”, de nossa autoria,  publicado, na Revista Prática Jurídica, Editora CONSULEX, 48, de 31 de março de 2006). Cf. também o PL EMI 204 MF AGU que prevê a transação e a conciliação de débitos tributários, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

 

[3] Consultem-se no citado informe das XXII Jornadas as considerações e as recomendações aprovadas por maioria de votos. Quito, Ecuador, 2004. Site: http://www.iladt.org/documentos/detalle_doc.asp?id=394 (Consulta em 1º. de março de 2006).          

[4] Cf. também noticiário do STJ, na internet, de 2 de maio de 2005. A magistrada criticou o distanciamento entre a Justiça e os jurisdicionados, certificando que “aqui (nos autos), eu só julgo papéis, não vejo o rosto de ninguém. E para quem sempre foi juíza como eu, é extremamente doloroso você ler, e não ver, não olhar as pessoas nos olhos, enfim, não ter este contato humano” (cf. noticiário cit.).

[5]Cf.nossos trabalhos, A arbitragem e as correções necessárias, in Suplemento Direito & Justiça, Correio Braziliense, de 25 de julho de 2005, A arbitragem e a reforma do Judiciário, Suplemento Direito & Justiça cit. de 29 de novembro de 2004.

[6] Cf. http://www.portugal.gov.pt/Portal/PT/Portugal/Sistema_Politico/Constituicao/ (artigo 209, 2, da Constituição Portuguesa, 7ª Revisão, 2005). Sobre a arbitragem no direito comparado, consulte-se a obra do magistrado, de Goiás, Vítor Barboza Lenza, Cortes Arbitrais, AB Editora, 1997, e, no direito espanhol, Legislación Arbitral, edición a cargo de José G. Llobregat, Editorial Colex, 1998, Madrid.

 

[7] Cf. nosso trabalho cit. na remissão nº. 1.

 

 

O Professor Leon Frejda Szklarowsky é advogado, conselheiro e presidente da Comissão de Arbitragem da OAB-DF, jornalista, subprocurador-geral da Fazenda Nacional aposentado, juiz arbitral da American Arbitration Association (NY-USA), em São Paulo. Acadêmico do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, da Academia Brasileira de Direito Tributário, de Letras e Música do Brasil e Maçônica de Letras do Distrito Federal,  membro dos Institutos dos Advogados Brasileiros, de São Paulo e do Distrito Federal e da Associação Nacional dos Escritores. Presidente da Comissão de Ética e Gestão da III Câmara de Mediação e Arbitragem do Brasil. É autor de inúmeras obras literárias e jurídicas. Em elaboração final: Teoria e Prática da Arbitragem .

18/02/2010 - Posted by | Uncategorized

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